sexta-feira, 23 de março de 2012

Ralo

Uma vida que já foi sonhado. Sonhos que já foram desacreditados. Ilusões que se realizaram. As mesma metades, que antes não pertenciam ao meu par, com tanto atrito, tanto desgaste, acabam se encaixando.
Chove, molha. Venta, cai. Sol, seca. No barulho, ensurdece. No silêncio, enlouquece.
Não cria, não age, não conversa, não sabe, não sorri. Medo. Incerteza.
Mas isto já aconteceu antes. O que ele fez ? Como saiu do buraco ? Realmente saiu ? Aonde ele se perdeu ? Quando que tudo deixou de ser tão simples e se tornou tão incompreensível ? Em qual das curvas ele se virou para o lado errado ? Pensou tanto antes de tomar cada decisão, teve tanto medo de errar. Buscou dar tantas certezas à tantas pessoas, que agora não as tem mais para si mesmo.
Se afastou tanto, com medo de ser ruim para tantos. Mas o verdadeiro medo era de ser ruim para ele mesmo. Sempre lhe disseram ser tão bom. Sempre lhe disseram ser tão certo. Mas o que é certo ? O que é bom ? Perdeu essas noções há muito tempo. Seria mesmo um fruto do acaso ? Alguém gerado por coincidências e ironias ? Se sim, acaso de quem ? Se não, o que realmente é então ? Se é que é um pedaço do que já foi.
Mas o que foi ? O que nunca completamente se realizou ? O que cresceu atrás de sombras ? O eterno bom futuro ? Ou o futuro simplesmente não foi tão brilhante ?
Seria mesmo tudo que lhe disseram que seria ? Seria mesmo tão bom quanto lhe prometiam ? Seria tão fácil ? Tão direto, tão simples, tão objetivo. Não era fácil. Era torto, era complicado, era abstrato. Talvez tudo não fosse tudo que deveria ser.
Talvez fosse como deveria. Ele só tinha as expectativas erradas, alienadas. Diziam que nada era simples, que a vida era cruel. Que crueldade é essa ? Que rumo sem sentido é esse que as coisas acabam sempre tomando ? Quem uma vez já teve solução para tudo, havia se esquecido de todas as respostas. Não se culpava por não sabê-las. Mas sim por não saber aonde essas respostas haviam ficado. Se deixou levar por tempo demais. não sabia mais como recuperar o controle. Já teve o controle ? O que é controle ? É acordar às cinco da manhã e ter todo o seu dia "planejado" ? Mas nada é planejado. Nada quase sempre é simples. E quase tudo quase sempre é tão sem aquela alegria e cor que diziam ter.
Com um sorriso, esperava outro em retorno. Com uma piscada, talvez um sinal. Não sabia de que. Quando entendeu como usar essas "piscadas", entendeu que a vida havia mudado. Como em uma cena de filme em que repentinamente tudo vira, e o teto se torna o chão, e o chão é onde estão as estrelas. Tudo se torna inverso, reverso, controverso, sem nenhum aviso ao personagem. Talvez grande parte da aventura esteja em se acompanhar a tragédia desse personagem. No filme, é divertido. Aqui, a vida era o roteirista sacana e ele era o personagem de uma história da qual ele não era o dono.
Se sentia como o último paciente. O último passageiro. Alguém que está ali para ver as luzes se apagarem. Esperou tanto para vê-las acesas. Teve pressa, e as viu cedo demais.
O menino que queria ser homem. O garoto que se perdeu.