segunda-feira, 25 de junho de 2012

Bit, byte e evolução

O tempo muda o mundo
O mundo muda, nada!
Muda muito em muito pouco
O tempo mudo nos faz de louco

Os tempos mudam
A gente se muda
E se manda no
meio do mundo

Em busca de informação
Bit, byte, mega formatação.
Em nervos de aço,
Em busca de espaço e evolução.

Nos trouxe o tempo num pote miúdo
O que era moderno e já não é mais
O tempo bate nas costas do mundo
De giga e tera ja não terá paz!

De lá pra cá, o tempo.
Nem mudou muito
Muda muito, não muda nada.
Muda tanto e tão pouco

Muda tão muito, de pouco em pouco.
Em pouco tempo o muito é pouco
E o pouco, muito pouco muda o muito
E o muito muda o mundo muito pouco.

- Henrique Napolião Barreto

quarta-feira, 13 de junho de 2012

De tantas saudades, guardei o seu sorriso.

Deve fazer um ano. Dois. Seis meses. Não sei mais. Acordava e sentia tudo tão igual. Tudo tão do mesmo jeito que sempre tinha sido tão comum. Devem ser uns 4 meses. 2 semanas. Tantos anos iguais. Tantos anos de um mesmo jeito. Tantos anos indiferentes. Tantos anos. Acho que fazia frio. Mas eu me lembro de estar suando. Não me lembro tão bem mais. Iria de bicicleta. Fui de carro. Nem sabia aonde era. Nem sabia pra onde ia. Nem sabia de merda nenhuma. Achava varias coisas. A falta de preparo psicológico típica da idade. Mas se dizia não ter essa idade, por dentro. Jurava carregar consigo tanto. Jurava tanto. Devem ter sido algumas horas. 19 minutos. Em um empelotamento de segundos, achou ter mudado o que não mudara em tanto tempo. Achava demais, sabia de menos. Talvez dias, talvez um só. E nessa ilusão se encaminhou. Não estava à frente. Não era melhor. Nunca foi. Mas que desgosto, que decepção. Que falha nas expectativas. Marmorarias ao lado de igrejas, bares em frente às escolas. Pensa tanto em como tudo é e em como tudo se transforma. Não vê mais diferença entre a falha e a ação. Tantos sonhos, ao longo de tanto chão. Nem anda tanto. Nem sabe tanto. Nada é tanto. Tanto é tão pouco. Sonha com um dos carros do jornal. Alucina com as mulheres do cinema. Adrenalina ao atravessar a ponte sobre a marginal. Quer morar num dos prédios bacanas que vê no horizonte. Tão bonitos, altos. Atravessa um viaduto, vê um restaurante, vê um bar, vê um hospital, vê tantas pessoas. Vê uma menina. Parada na esquina. Não é mais menina. Mas se lembra dela. estudaram juntos. Ele foi em seu aniversário. Ela no dele. Eram amiguinhos do tipo que correm atrás de pombos no pátio do colégio. Mas ela não vê ele. O insul-film mental escurece suas lembranças. Quantos anos fazem ? Dez ? Sete ? Mais do que qualquer um gostaria. A esquina some, na fumaça do escapamento do ônibus. Agora vê uma praça. Um prédio nela. Vazio. Mas de luzes acesas. Lá em cima tem um heliporto. Lembrou que nunca viajou em um helicóptero. Deve ser divertido. Numa linha de pensamentos estranha e desconexa, lembrou que nunca tinha pulado de para-quedas. Lembrando tanto com tão pouco. Desce do ônibus. Contorna a dita praça. Um acidente, uma viatura. Lembra de quando foi assaltado. Gostava tanto daquele celular. Segue andando. Vira na avenida. Os sinos da igreja tocam. Nem sabia que essa igreja ainda tinha sinos. Olhou para trás para ver a torre do relógio. Não parou de andar. Trombou com alguém que vinha na direção oposta. Alguém que não via a igreja, acidentes, viaturas. Só via o relógio no pulso, e a hora de chegar em casa. Talvez a mulher estivesse esperando. Talvez atrasado para buscar o filho no colégio. Talvez tantas coisas. Talvez eu nunca mais o veja. Talvez ele me encontre pela rua e aponte o dedo em meu nariz ao dizer "eu lembro de você". Talvez. Mas o que eu sei é que ele me xingou. "olha pra frente, filho da puta". Não se pode nem olhar para a pouca beleza da simplicidade que ainda resta nessa cidade. Continua andando, está escurecendo. Os faróis dos carros já estão acesos, formando um abstrato rio de luzes amarelas que vem, e vermelhas que vão, por baixo da ponte. Sente medo de cair, em uma cena de filmes, rolando por cima de caminhões. O semáforo abre para pedestres e ele acorda do devaneio ao desviar de um motociclista que tenta aproveitar os últimos suspiros da luz verde. Quase se tornam seus próprios suspiros finais. A descida se estabiliza, até se tornar uma subida. Uma inclinação imperceptível do corpo para a frente, para vencer a inclinação. Bem pequena, mas seus joelhos a sentem. Lembra, em meio às pequenas dores, de quando corria em torno da casa de sua avó. Caía, e ralava seus joelhos. Saravam tão rápido. Percebe que talvez só não se importasse tanto com a dor. Sente que não é mais o mesmo que já foi. Sente medo do que será. Sente medo da dor. Sente medo. Mas continua andando, e, em passos largos com as grandes pernas, se esquece da pequena dor. Amanhã deve se lembrar dela. Atravessa outra praça, maconha e um bar entre cartazes de "legalize já" e "greve já". Revolucionários de Facebook. Che Guevara via twitter para iPhone. Chega em sua faculdade. A praça parece um 8. Infinidade de problemas. Um professor de greve com a greve. Um pombo dourado, turma do centenário. Sempre acha esse pombo tão exagerado. Tão sem sentido. Mas, o que é sentido pra quem vê prédios e pensa em rios de faróis ? Entra na sala, mochila na mesa, andou depressa, está suando. Banheiro, espelho, pia, água, papel, ar condicionado. Pensa nos grevistas. Alunos em greve. É fácil fazer greve pra não vir na aula. Aula do mesmo professor da tantas outras quartas. Times rivais, sempre com piadas. Ele se gaba da nova contratação, eu digo "meu time vai ganhar a serie B". Aula começa. Xerox, sala de novo. Ele não faz chamada, alguns desertam. Sai da sala, um barulho ensurdecedor. Tambores e apitos gritando pela greve. Interrompem a aula. Um professor se entrega à repressão dos grevistas, e dispensa sua turma. Não o meu. Não, ele não. Ele tem cara de ser aquele aluno da primeira série que anotava para professora o nome de quem conversava. Tem uma boa carreira. Tem um bom casamento, tem livros publicados. Pensa se algum dia chegará a um ponto semelhante. Se recorda de seu pai, que sempre disse algo que pode ser resumido em "o sucesso vem pra quem vai até ele". Liga isso a um debate de aulas anteriores. O que é sucesso ? Já foi criticado, tantas pequenas dúvidas, tantas frases de efeito. "Você tenta parecer inteligente com esse jeito de pseudopoeta, de intelectual frustrado. Você não é inteligente". Nunca disse ser. Nunca se gabou de ser. Parece sertão divertido ser levado para partidos de esquerda ou de direita cegamente, como tantos outros. Incorporar um discurso alienador à sua doutrina pessoal. Viver a expectativa de seguir bakuninistas no twitter. Devem ter sido quinze horas. Foram duas. A aula acabou. Greve incerta. Tão incerta quanto o futuro do país. Tão incerta quanto os destinos dessa geração. Todos indo embora. É quarta-feira, mas o amanhã não existe mais. Não se tem aula, e isso é o mais distante que o aluno pensa. A noite vai virar festa. Ou não. Preocupação de tantos pais, descaso de tantos outros. A praça ainda cheira maconha. Deviam fazer cartões postais dessa praça, com um cheiro típico. Cheira também esgoto, terra revirada em função das reformas. Outra caminhada para pegar outro ônibus que não passa no asfalto mal acabado. A barriga lhe engana, sente vontade de comer. Imagina a sua geladeira, esperando para ser aberta. Lembra do seu irmão. Ele com certeza deve ter comido tudo. A rua fica muito escura. Atravessa a escuridão, algumas encaradas no meio das sombras. Não sente medo do escuro. Não sente medo do irreal. Sente medo do que existe, do que é, do que foi, do que são. Se perde, pensando. Pensando, figurando, imaginando. Viajando, lembrando. Tanto, tão pouco. Seu ônibus vem chegando, não consegue ler o letreiro através das lentes já arranhadas de seus óculos. Confirma que é aquele ônibus, entra, passa a catraca. Não está cheio. Não está vazio. É mais um ônibus. Com mais um monte de gente. Vindo de um monte de empregos. Com um monte de filhos. Que estudam em um monte de escolas. Com um monte de professores e professoras. Que pegam um monte de ônibus. Senta ao lado de duas meninas, não tão meninas, mas com assunto de meninas. Tenta ouvir o que elas conversam. Não é fofoqueiro. Só queria se distrair, se destacar da realidade de quem está indo embora perto da meio noite em um ônibus. Perde a linha da conversa, seu fones de ouvido estão mais interessantes. Músicas que falam de tantos lugares e tantas vidas. Mas só tem uma. Pensa mais uma vez, talvez a quinta ou sexta em seu dia, na inutilidade de seu dia a dia. Pensa em como seria aquele ônibus, sem mais um passageiro, sem mais um dos tantos outros montes. Seria mais um ônibus, com outro aluno, com outra pessoa. Devem ter sido quarenta minutos. Vinte ? Uma hora, talvez. Se perdeu nas músicas, e na admiração da beleza fria da noite urbana. Semáforos piscando em tons de laranja em ruas desertas. Olhos piscando em tons de desgosto e descaso em janelas de ônibus. Chega em seu terminal. Lembra de um dia em que se encontrou com amigos ali. Lembra de outro em que viu uma moça linda ali. Nunca mais a viu. Nunca mais os encontrou. Quem seria ela ? Aonde estariam eles ? Passa a catraca final, se depara com a imensidão de uma avenida mal iluminada e deserta. Se sente em casa. Cresceu ali, andaria de olhos fechados sem tropeçar nas deformações de suas calçadas. Sabe em quais casas existem cachorros que assustam os pedestres, e em quais casa existem velhinhas que ficam na porta com um ar de "vou devagar porque já vivi demais". Por um breve momento, depois de seu dia, inveja a velhinha. Um banco vazio, com ninguém além de um guarda em seu interior. Há sete, oito, talvez cinco horas, quando foi à aula, o mesmo banco mais parecia um formigueiro. Pessoas se trombando e se xingando, sem nem lembrar dos rostos alheios. Se lembrou de quanto odiava lugares tumultuados. De quando era pequeno, e ia para feiras, e não enxergava nada além da mão de sua mãe lhe puxando em meio a tantas pessoas, tantas barracas. Atravessa a rua, desvia de alguns bêbados, cumprimenta o mesmo gato preto de todos os outros dias. Lembra-se de um livro que leu, quando pequeno, de bruxos que tinham o poder de se transformar em animais. O mesmo gato, do mesmo jeito, no mesmo horário, todos os dias. Tinha vontade de sentar no meio fio e oferecer um chocolate para o tal gato. Mas nunca parava de andar. O joelho ressuscita, dá uma pontada de dor, para não deixar ser esquecido. Lembra da caminhada de fim de tarde. Dos sinos, rios, luzes, faróis, amigas, amores. Está em casa. O poste está queimado de novo. Com a luz do celular, acha sua chave dentro da mochila. Abre seu portão. Seu cachorro o recebe com a mesma alegria retardada de sempre, mostrando já ter esquecido a briga da manhã. Tenta lamber seus pés, mas ele não deixa. Está cansado demais para tentar se divertir com um cachorro. E ainda tem cheiro de gato preto da rua, só arranjaria confusão. Passa pela porta, entra em sua casa. Não acende as luzes, já conhece bem seu lar. Fecha os olhos, anda até o quarto, acende seu abajur. Seus pais já dormem. Há alguns dias não vê o pai, seus horários não batem mais, faculdade, trabalho. O preço da vida "adulta". Conversou com a mãe antes de sair. Ela ronca, como alguém que estufou a barriga com torresmo e refrigerante antes de dormir. Nem refrigerante ela bebe. Devem ter sido alguns momentos. Alguns, bem poucos. Joga sua camisa na cama. Lembra-se do que falou com a mãe. Que bagunça é essa, meu filho ? Não se pode ser assim. Saiu para a aula, pensando que quando chegasse a bagunça e a mãe ainda estariam lá. Mas e se não estivessem ? Não gosta de trabalhar com suposições negativas. Mas a certeza é algo tão idiota. É tudo tão idiota. Ele é tão idiota. Senta em sua mesa, joga chaves e carteira em cima da cama. Quicam e caem no chão. Ele se levanta para pegar. Se lembra da sua avó. A mesma da casa onde ralava tanto seus joelhos. "Preguiçoso trabalha em dobro". Dá uma risada. Liga seu computador, um momento de descanso em meio à tanta movimentação. Nem é tanta, mas ele gosta de dramatizar. Notificações, emails novos. O relógio apita a meia noite. Já é outro dia. Já são outros momentos. Nesse apito, alguém morreu. Nesse apito, alguém nasceu. Nesse apito, tanto aconteceu. Quantos outros apitos não apitaram ao mesmo tempo do seu ? Tantos apitos, quantos apitos, tão poucos apitos. Apitos. Segunda série, festinha de aniversário no recreio. Deixou o apito cair no chão. Pisaram no apito. Pequenas coisas, das quais ninguém se lembra. Pequenas definições do que se dá de cada pessoa. Ouve barulhos na rua, já se acostumou. Ouve músicas. Quase sempre as mesmas de quase todo dia. Mas sempre as ouve como se fosse a primeira vez. Pensa nos trabalhos da faculdade, no dinheiro acabando, naquela moça que não soube convidar para sair. Pensa em dormir. Pouco sono. Deita assim mesmo. Amanhã vai ser outro dia, ele vai ser outra pessoa. Todos serão outros, os ônibus não passarão sobre as mesmas pedras, os cigarros não serão fumados com o mesmo prazer, as cervejas não serão tomadas com a mesma saudade. Lembranças de tantos carnavais, tantas fantasias. Será tudo diferente. Mas vai ser outro dia, ninguém se importa. Deseja boa noite ao ar, alguém que possa ouvir. Mesmo não ouvindo, gosta de pensar que alguém lhe disse o mesmo, à distância. Tanto a ser, tanto a fazer. Tanto. Deve ter sido um dia. Vinte e quatro horas. Toda a vida. Na porta do bar, fica escuro mais cedo.